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Fertilidade nas síndromes de Turner e Klinefelter: onde estamos e qual o futuro?

Por Gil Guerra Junior , em ENDOCRINOLOGIA PEDIÁTRICA , dia 1 de junho de 2023 Tags:, , ,

Este tema foi parte da grade científica do 15º Congresso Paulista de Endocrinologia e Metabologia, realizado entre os dias 4 e 6 de maio de 2023. Abaixo, confira uma síntese da aula.

Síndrome de Turner (ST)

A ST é uma anomalia cromossômica que afeta mulheres (1:2150 recém-nascidas vivas) que têm um cromossomo X normal e a perda total ou parcial (braço curto) do segundo cromossomo sexual em associação com um ou mais sinais clínicos. O mosaicismo na ST é a regra (cariótipo 45,X ocorre em cerca de 40% a 50% dos casos). A identificação do mosaicismo está associada ao número de células contadas na análise do cariótipo. Quanto mais células contadas, maior é a chance de detectar mosaicismos de baixa frequência.

Do ponto de vista de características sexuais secundárias espontâneas, 100% das pacientes com ST fazem pubarca normal; 30% a 40% fazem telarca com ou sem progressão; 10% completam a puberdade e menstruam; quase todas vão evoluir com amenorreia primária ou secundária; e apenas 1% a 2% têm fertilidade.

Das que chegam a engravidar espontaneamente, 50% vão ter filhos normais; no entanto, existe maior risco de abortamento espontâneo, nascimento de crianças pequenas para a idade gestacional e risco 10x maior que uma mulher sem ST de ter uma criança com síndrome de Down e 30x maior de ter uma com ST. Além disso, a gestação numa paciente com ST é de alto risco de morte, especialmente para aquelas com alguma cardiopatia (as cardiopatias na ST estão presentes em 40% a 50% dos casos).

A apoptose dos folículos ovarianos na ST é muito mais rápida que nas mulheres sem ST. Portanto a chance de preservar a fertilidade nas pacientes com ST é maior quanto mais jovem for a paciente.

Em geral, aquelas com maior chance de puberdade e fertilidade espontâneas são as que apresentam mosaicismo 45,X/46,XX ou 45,X/47,XXX (o que não impede as demais de terem fertilidade, na dependência do mosaicismo nos ovários) e as que não têm FSH aumentado ou AMH (hormônio antimülleriano) diminuído na infância. A possibilidade de preservação da fertilidade para essas pacientes é basicamente através da criopreservação de ovários, o que não garante a certeza de ter óvulo(s) no futuro. Para as pacientes adolescentes ou adultas, existe a possibilidade de criopreservação de óvulo(s) ou embrião(ões). A contraindicação formal de fertilidade para todas é a presença de cardiopatia, em especial a coarctação de aorta ou a presença de próteses valvares.

Portanto as possibilidades de fertilidade na ST ainda são pequenas e com alto risco para mãe e feto.

Sugestão de leitura: Więcek M, Gawlik J, Nowak Z, Gawlik A. Questions concerning fertility preservation during transition in girls with Turner syndrome: review of the literature. Endocr Connect. 11(12):e220344, 2022.

Síndrome de Klinefelter (SK)

A SK é uma anomalia cromossômica que afeta homens (1:500 a 1:1.000 recém-nascidos vivos) que têm um cromossomo X a mais no cariótipo (47,XXY). O mosaicismo na SK é a exceção. Menos de 10% dos casos são 46,XY/47,XXY ou aneuploidias mais graves (48,XXXY ou 49,XXXXY). Raramente a SK é diagnosticada na infância. Pacientes com SK apresentam todos os dados antropométricos normais na infância e não têm outras características fenotípicas, exceto atraso de fala. O que caracteriza a SK na puberdade e vida adulta do ponto de vista clínico é a microrquidia (média de volume testicular adulto de 6 mL) e a azoospermia.

Do ponto de vista laboratorial, LH, FSH, AMH, inibina B, testosterona total e estradiol são normais na infância e podem estar alterados a partir da puberdade (LH, FSH e estradiol elevados, AMH, inibina B e testosterona diminuídos), caracterizando um hipogonadismo hipergonadotrófico. A disfunção testicular na SK é progressiva, sendo mais leve na vida fetal e infância e mais grave na puberdade e vida adulta.

Apesar de praticamente 100% dos homens adultos com SK terem azoospermia, a possibilidade de se conseguir espermatogônias ou até espermatozoides por técnicas cirúrgicas é de 50% a 60%, não sendo esse índice afetado pela idade (entre 15 e 22 anos x 23 a 39 anos) ou pelo uso prévio de testosterona. As técnicas descritas são a punção testicular por agulha fina, a TESE (testicular sperm extraction) convencional ou a TESE por microcirurgia. O sucesso de fertilidade com essas técnicas seguidas de fertilização in vitro com nascimento de crianças saudáveis gira em torno de 25% a 40%.

Portanto as possibilidades de fertilidade na SK têm se modificado rapidamente nos últimos anos e com resultados muito promissores e já disponíveis nos grandes centros do país.

Sugestão de leitura: Sá R, Ferraz L, Barros A, Sousa M. The Klinefelter Syndrome and Testicular Sperm Retrieval outcomes. Genes (Basel).14(3):647, 2023.

Por Gil Guerra Júnior – clique para ver o CV Lattes

imagem: iStock

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