Obesidade e covid-19: impacto em variados graus de IMC
Em recente artigo publicado no Lancet Diabetes & Endocrinology, os autores investigaram a relação entre obesidade e a severidade da covid-19. A obesidade é o maior fator de risco para desfechos adversos da infecção por SARS-CoV-2. Nesse estudo prospectivo com 6,9 milhões de pessoas no Reino Unido entre 20 e 99 anos, o objetivo foi definir se essa relação seria espúria ou um viés de colisão, já que a obesidade per si e a severidade da covid-19 aumentam a chance de internação hospitalar.
Os estudos e as meta-análises anteriores já haviam reportado a associação da obesidade com o risco de desfechos graves da infecção, entretanto, incluíram pacientes obesos internados com sintomas de covid-19, mas não levaram em conta o impacto de variados graus de índice de massa corporal (IMC kg/m2) em diferentes grupos demográficos e em pessoas com outras doenças crônicas. O estudo encontrou uma associação entre o aumento progressivo do IMC e o risco de desfechos graves (internação hospitalar, admissão em Unidade de Terapia Intensiva-UTI ou morte).
- Há uma correlação linear entre a admissão na UTI por covid-19 e a progressão do IMC, e uma associação não linear para internação hospitalar e morte.
- Cada unidade de acréscimo no IMC acima de 23 kg/m2 está associada a aumento de risco de internação hospitalar (HR 1.05 [95% CI1.05-1.05]), admissão em UTI (HR 1.10 [95% CI1.09-1.10]) e morte (HR 1.04 [95% CI1.04-1.05]).
- A relação entre o IMC e a internação hospitalar e morte é uma curva em forma de J, provavelmente porque ambos os eventos estão ligados a fragilidade, que está mais comumente ligada a IMCs mais baixos.
- A associação do IMC e a gravidade dos desfechos não se associa à presença de diabetes tipo 2 (DM2) e a outras comorbidades.
- O IMC é um fator de risco mais impactante em jovens (20-39 anos) quando comparado com idosos (> 80 anos) e em negros comparado com brancos.
- O risco de morte aumenta somente em pessoas com IMC > 28 kg/m2.
- DM2 está presente em 1/3 da população do estudo.
Os mecanismos subjacentes relacionados a essa associação ainda não estão totalmente elucidados. As principais hipóteses são:
- O aumento da gordura visceral além do IMC tem plausabilidade porque grupos com os desfechos mais graves (homens, negros e DM2) apresentam tendência em depositar gordura no tecido visceral e em outros tecidos como fígado, coração e músculo esquelético (gordura ectópica);
- O excesso de peso causaria dificuldade no manejo desses pacientes, como dificuldade na intubação, no posicionamento e movimentação pelo staff de enfermagem;
- O estado pró-infamatório crônico de baixo grau da obesidade.
Esse grande e representativo estudo populacional acrescenta alguns pontos que considero relevantes: demonstrou que mesmo pequenos aumentos no IMC acima de 23 kg/m2 estão associados a um pior desfecho da covid-19. A população mais afetada pelo IMC são os jovens (20-39 anos) e os negros. O excesso de peso, mesmo na ausência de outras doenças, está associado ao risco aumentado de hospitalização e morte, principalmente em jovens. O excesso de peso é um fator de risco modificável, assim o controle do sobrepeso e da obesidade e estratégias preventivas em longo prazo podem reduzir a gravidade da covid-19.
Dra. Sylka Rodovalho – Clique para ver o CV lattes
Referência:
imagem: iStock
Comments