Definição, metas e tratamento da criança com obesidade

No Dia Mundial da Obesidade deste ano, celebrado em 4 de março, foi lançada a sexta publicação do Atlas Mundial da Obesidade, abordando o impacto das doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs) associadas ao excesso de peso. O Atlas revelou que a prevalência de crianças com IMC (índice de massa corpórea) elevado no Brasil passará de 34% para 50% em 2035, e, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o aumento do número de crianças entre cinco e 19 anos foi de 10 vezes na última década em todo o mundo. A projeção para crianças e adolescentes (entre cinco e 19 anos) com obesidade em 2035 é de mais de 750 milhões, o equivalente a duas em cada cinco.

Considerando o impacto da condição crônica e a associação com outras doenças como hipertensão arterial, síndrome metabólica, diabetes tipo 2 e dislipidemia, uma breve revisão da literatura mostra que, nos últimos 15 anos, observa-se maior frequência de casos com IMC muito elevado. Outro aspecto a ser considerado é a exposição a experiências adversas durante a infância, o que, além de comprometer a saúde física e mental, está associado ao maior risco de obesidade. Experiências adversas na infância podem ser situações de turbulência familiar, exposição à violência, dificuldades financeiras, perda de um dos pais, abuso e doença mental parental, por isso países vivenciando situações de extrema vulnerabilidade provavelmente também necessitarão de estratégias para enfrentamento da maior prevalência de obesidade.

No início deste mês, uma revisão publicada no periódico internacional Nature, sob o título The evolution of the understanding of obesity over the last 100 years, trouxe importante análise a respeito da compreensão sobre obesidade e como ela evoluiu no último século, partindo de um olhar parcial (comer excessivamente e falta de autocontrole) para uma definição ampla e baseada em evidências, na qual observa-se uma complexa interação entre fatores genéticos, socioeconômicos e ambientais.

E por falar em evidências científicas, no início de 2023, a primeira diretriz de prática clínica para avaliação e tratamento de crianças e adolescentes com sobrepeso e obesidade foi lançada pela Academia Americana de Pediatria, destacando a importância de apresentar a curva de IMC para a família e, com seu consentimento, explicar sobre as alterações do peso em relação a idade, sexo e estatura do paciente. Deve-se evitar termos que adjetivem a condição clínica e possam trazer desconforto. O documento pode ser acessado abaixo.

https://publications.aap.org/pediatrics/article/151/2/e2022060640/190443/Clinical-Practice-Guideline-for-the-Evaluation-and?autologincheck=redirected.

Apesar dos avanços ao conhecer a herança poligênica da obesidade exógena, os fatores hereditários associados (como o IMC materno) e a importância de cuidar da nutrição nos primeiros mil dias de vida, as opções terapêuticas disponíveis em Pediatria ainda são escassas e geralmente disponíveis apenas para maiores de 12 anos. O estudo SCALE Kids com liraglutida na faixa etária entre seis e 12 anos é uma exceção, buscando compreender a eficácia e segurança da classe agonista do receptor de peptídeo-1 semelhante ao glucagon (GLP-1) para menores de 12 anos, pois a manutenção de valores menores de IMC em longo prazo ou a necessidade de perdas significativas pela existência de comorbidades em geral não é alcançada apenas com as mudanças comportamentais do estilo de vida.

Como especialistas ou familiares, educadores ou membros de uma sociedade em constante organização, é preciso buscarmos iniciativas que favoreçam a chegada de informações de qualidade e a criação de ambientes saudáveis para o crescimento e envelhecimento sustentável da população. Comece pelo exemplo, evitando o consumo de alimentos ultraprocessados e de alta densidade calórica, e não hesite em buscar ajuda rapidamente quando necessário.

Dra. Amanda de Paula Coelho – clique para ver CV Lattes

Referências:

1. Gómez-Ambrosi, J., Catalán, V. & Frühbeck, G. The evolution of the understanding of obesity over the last 100 years. Int J Obes (2024). https://doi.org/10.1038/s41366-024-01668-3.

2. Fox CK, Barrientos-Pérez M, Bomberg EM, Dcruz J, Gies I, Harder-Lauridsen NM, Jalaludin MY, Sahu K, Weimers P, Zueger T, Arslanian S; SCALE Kids Trial Group. Liraglutide for Children 6 to <12 Years of Age with Obesity – A Randomized Trial. N Engl J Med. 2024 Sep 10. doi: 10.1056/NEJMoa2407379. Epub ahead of print. PMID: 39258838.

3. World Obesity Federation. World Obesity Atlas 2024. London:World Obesity Federation, 2024. https://data.worldobesity.org/publications/?cat=22.

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5. Lister, N.B., Baur, L.A., Felix, J.F. et al. Child and adolescent obesity. Nat Rev Dis Primers 9, 24 (2023). https://doi.org/10.1038/s41572-023-00435-4.

6. González Bagnes, M. F., González, C., Hirschler, V., & Di Girolamo, G. (2022). Pharmacotherapeutic options in pediatric obesity: an urgent call for further research. Expert Opinion on Pharmacotherapy, 23(8), 869–872. https://doi.org/10.1080/14656566.2022.2050212.

7. Wahi G, St-Pierre J, Johnston BC, Fitzpatrick-Lewis D, Usman A, Sherifali D, Merdad R, Esmaeilinezhad Z, Birken CS, Hamilton J, Henderson M, Moore SA, Ball GDC, Morrison KM; Steering Committee for Updating Canada’s Clinical Practice Guideline for Managing Pediatric Obesity. Effectiveness of pharmacological interventions for managing obesity in children and adolescents: A systematic review and meta-analysis framed using minimal important difference estimates based on GRADE guidance to inform a clinical practice guideline. Pediatr Obes. 2024 Nov;19(11):e13169. doi: 10.1111/ijpo.13169. Epub 2024 Sep 6. PMID: 39238400.

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