Caso clínico: sintomas psiquiátricos relacionados à cabergolina
Trazemos nesta edição o caso clínico que envolve a associação entre o uso de agonista dopaminérgico e sintomas psiquiátricos, uma relação ainda desconhecida por parte dos endocrinologistas. Abaixo, seguem os comentários da endocrinologista responsável pela condução do caso, Dra. Andrea Glezer (USP) e, em seguida, o caso apresentado em vídeo pela residente do 2º ano de Endocrinologia da Faculdade de Medicina do HCUSP, Anna Louise Stellfeld Monteiro.
Sintomas psiquiátricos relacionados à cabergolina: o que é preciso saber
O caso apresentado pela Dra. Anna Louise Stellfeld Monteiro é de uma paciente acompanhada em nosso serviço, portadora de macroprolactinoma, sensível a cabergolina, como a maioria dos casos. Porém, por efeito colateral psiquiátrico, houve necessidade de suspensão do agonista dopaminérgico (AD); e, após avaliação psiquiátrica, a reintrodução em dose menor, resultando na perda do controle hormonal e redução tumoral que haviam sido previamente atingidos com doses maiores de cabergolina.
Em paciente jovem, com macroprolactinoma com potencial de crescimento e sem o uso adequado do AD, o tratamento cirúrgico foi indicado, com sucesso. O quadro de ansiedade desapareceu por completo após a suspensão da cabergolina. A discussão desse caso é importante porque muitos endocrinologistas podem não estar cientes da associação entre o uso de agonista dopaminérgico e sintomas psiquiátricos. Além disso, não há diretrizes específicas para o manejo de pacientes que apresentam problemas psicológicos pelo uso de AD.
Os agonistas dopaminérgicos constituem o tratamento de primeira linha para os prolactinomas, por serem capazes de restaurar a função gonadal, diminuir a galactorreia, abaixar os níveis de prolactina e reduzir as dimensões tumorais na maioria dos casos. Com a cabergolina, o controle clínico, hormonal e tumoral ocorre em 80% a 90% dos casos. Os efeitos adversos mais frequentes dos ADs incluem náuseas, tonturas, hipotensão ortostática e dores de cabeça.
Vários efeitos colaterais psiquiátricos também foram descritos, muitos como relatos de casos isolados: psicose, mania, ansiedade, depressão, confusão, alucinações auditivas, hiperatividade, insônia, pesadelos, paranoia e transtornos de controle de impulso (TCI). Os sintomas de doenças psiquiátricas foram relatados “de novo” após o início da terapia com AD ou como exacerbações de doença psiquiátrica previamente conhecida.
Ademais, segundo a literatura, os pacientes com hiperprolactinemia parecem ter diminuição da qualidade de vida e diferentes perfis de personalidade em comparação a indivíduos de controle, o que poderia estar relacionado à alteração do tônus dopaminérgico. Recentemente, diversos relatos e séries de casos incluíram pacientes portadores de prolactinomas que apresentaram TCI pelo uso de AD. Essas alterações foram reversíveis após a interrupção ou redução da dose do AD. O paciente deve ser monitorado cuidadosamente por endocrinologista e psiquiatra. Há também relatos de depressão grave, episódios maníacos ou psicose associados ao uso de AD, tendo sido sua suspensão a conduta adotada na maioria dos casos. Na prática clínica, deve-se estar ciente do potencial de precipitação de doenças psiquiátricas ao se prescrever um agonista dopaminérgico, mesmo na ausência de história psiquiátrica prévia.
Portanto, em pacientes portadores de prolactinoma, em uso de AD, que apresentarem doença psiquiátrica, deve-se realizar avaliação com psiquiatra e ir acompanhando individualmente se o AD deve ser suspenso ou ter sua dose reduzida. Especialmente nos macroprolactinomas, a indicação do tratamento cirúrgico deve ser considerada.
Andrea Glezer — clique para ver o CV Lattes
Aperte o play no vídeo abaixo e conheça os detalhes deste caso clínico.
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